Um dinamarquês muito português.

O encontro foi na esplanada do restaurante da Ordem dos Engenheiros, um pequeno refúgio no último andar do edifício, com vista para o Parque Eduardo VII e o Marquês de Pombal. Um local que, diz Jesper Carvalho Andersen, tem muito a ver consigo. “Eu gosto muito da cidade de Lisboa, gosto muito da luz e aqui tem-se uma vista fantástica. Estamos no centro de Lisboa, mas quase não há barulho e temos uma vista fantástica”. “É possível ainda em Lisboa fazermos uma vida à maneira antiga. E depois eu gosto muito do ambiente tradicional, comida à boa antiga portuguesa, e gosto do facto de conseguir encontrar segredos como este”. De riso fácil e gargalhada sonora é em português, com algum sotaque, que nos conta a sua história.

Dinamarquês, nasceu em 1962 na província, numa pequena ilha, com 200 pessoas, e por lá cresceu até que a que trocou por Copenhaga para ir estudar. E assim começou uma vida de itinerância que acabou por o trazer para Portugal. Antes de acabar os estudos foi para Itália porque queria ser joalheiro, esteve dois anos em Roma, aprendeu italiano. “Finalmente consegui um emprego como estagiário numa empresa muito prestigiada de joalharia, mas só fiquei lá duas semanas porque realmente só tenho a parte estética, não tenho quaisquer capacidades manuais”, conta, entre risos. Ficou em Roma mais um ano, depois foi para a Alemanha, ficou lá outro ano, e regressou à Dinamarca para acabar os estudos, tendo depois seguido para França para tirar um master. “Depois implementei a minha tese numa empresa estabelecendo uma sucursal de uma empresa de móveis de prestígio, móveis arquitetónicos em Inglaterra. Correu tão bem que ganhei um prémio do ano de exportação na Dinamarca, só com 24 anos”.

Ficou em Londres, entrou no ramo da consultoria e ia muitas vezes a Paris, numa mota que tinha na altura. Por volta de 1990, recorda, numa dessas viagens a Paris, estava uma noite com um amigo nas escadas da Sacré Coeur e estavam em frente duas raparigas e um rapaz. “Uma delas era a minha Lúcia”. E desde então que Jesper e a sua Lúcia, uma jornalista portuguesa, nunca separaram. “Durante dois anos viajámos, eu para Paris e ela para Londres. Ela é jornalista, trabalhou no Telejornal da RTP. Foi para o BBC World Service trabalhar na secção portuguesa e vivemos juntos em Londres durante dois anos. Fui para Estrasburgo, a Lúcia foi comigo, de Estrasburgo fomos para a Dinamarca, a Lúcia aprendeu dinamarquês, casámos em Portugal, em Caneças, em 1994”, declara de um fôlego só.

Pelo meio deu início à carreira que tem atualmente. “Eu sou globalizer e capitalizer, ajudo as empresas a crescer, mas agora faço isso como não-executivo, já não tenho vida para fazer estas coisas a tempo inteiro, e depois arranjo capital para este crescimento acontecer”, explica. Só em Portugal, nos últimos anos, esteve envolvido na fusão que resultou na Brandia Central e na fusão entre a Vista Alegre e a Atlantis, negócio que, diz, “não foi tão giro, não correu tão bem, mas faz parte”, mas acredita que “são duas marcas fantásticas, que terão um regresso em grande”.

Mas a atividade profissional de Jesper Carvalho Andersen não fica por aqui. “Estou metido no futebol por paixão, tenho algumas ações em clubes de futebol, estou envolvido nas artes por paixão, sou administrador delegado do Grupo Vhils, o artista urbano, segui o crescimento dele nos últimos cinco anos, desde artista individual para um grupo empresarial grande”.

A mudança para Portugal só aconteceu em 1995. “Não podíamos continuar esta vida de cigano, sempre dois anos num sítio novo, com os filhos. Nasceu aqui em Lisboa em 2000 a Sofia e Thomas nasceu em Madrid, antes de nos mudarmos para cá. A Sofia é a única portuguesa da família, porque a Lúcia nasceu em França”, diz, entre gargalhadas. E como explica o facto de um dinamarquês ter Carvalho no nome? “Quando casei com a Lúcia ela ficou Carvalho Andersen, os filhos também são, então adotei o Carvalho para não ficar de fora”.

“Mas foi também porque eu me sinto muito português. Eu adoro Portugal! Adoro a qualidade de vida… Nós tivemos a possibilidade de escolher a nossa base em qualquer lugar, mas decidimos desde o início ter a base aqui”, recorda este adepto do Benfica e da Seleção das Quinas. A base é Lugar D”Além, na zona de Caneças, aquele que diz ser o “seu” local. “Adoro visitar o Douro, o Tejo é fantástico, sou grande fã da Madeira, mas o meu sítio favorito é o meu jardim. Gosto muito de estar no meu jardim, a olhar para o vale, e saltar para a piscina de manhã todo o ano”.

Fez as contas e, com a mulher, já mudaram de casa 35 vezes desde que estão juntos. Se voltarem a mudar, Jesper tem uma certeza. “será sempre para voltar, a casa fica cá. Nunca tirámos os móveis, nunca alugámos a casa, esta é a nossa base”.

 

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